Este conjunto de condecorações da Grande Guerra é o mais
querido que tenho. Agrada-me pelo que nos diz, agrada-me pela sua estética,
agrada-me pelo mistério do que não me conta mas, agrada-me sobretudo, claro,
pela sua Cruz de Guerra.
A sua proveniência é certa, um bom amigo fez-mo chegar intacto, apontando-me,
num pequeno papel, nome e família para identificação e futuro contacto. Portanto,
um bom conjunto. Portanto, cuidadosamente guardado por mim, para os que vêm
depois de mim.
- O conteúdo:
Uma bela Medalha da Cruz de Guerra de 1ª Classe, patine uniforme e intocada, fita de cinco
raios verdes tendo como única falha a falta de coloração original nos louros, tendo perdido algum do doirado original deixando denotar-se algum brilho da prata em que foram cunhados.
Uma outra bela medalha, a das Campanhas do Exército Português. Em
prata, com Barra de Feridos na Batalha de La Lys e Fivela da Campanha “França
1917-1918” no mesmo metal.
Por fim, a Medalha Portuguesa Interaliada da Victória. Em
Bronze, com a fivela correcta e legislada, uma fita exemplarmente conservada com particularidade de ter mais de 30mm (à Portuguesa) mas, menos de 37mm (à
Francesa). É apenas de lamentar as várias manchas de oxidação no bronze do
pendente.
As três unidas por uma barrete de esferas em prata, cortada
à medida certa para as diferentes larguras de cada medalha, incluindo barras,
fivelas e diferenças de largura nas fitas.
- A forma;
Legislativamente à data da instituição de qualquer destas medalhas, elas não
poderiam viver em conjunto. A Medalha da Cruz de Guerra e a Medalha Interaliada
da Vitória sim, mas a Medalha das Campanhas, irmã de decreto da MCG, era posta
do lado direito do peito, como aqui
e aqui é referido.
Sabendo tratar-se de um conjunto de um combatente,
à medalha da Vitória falta uma pequena estrela de prata, como sinal que, a
partir de 10 de Julho de 1920, com o decreto nº 6:756, faz a distinção entre os
condecorados militares (que recebem esta estrela) e os condecorados empregados
civis da Armada e do Exército (que usariam da medalha sem estrela).
Assim temos duas incongruências neste conjunto, a Medalha das Campanhas, que
não deveria aqui figurar, e a falta da estrela na Medalha da Vitória.
Bom, as razões chegam-nos com algum conhecimento da história do homem que as
mereceu. Alferes do Exército partiu para França ainda muito novo e passou pela
provação que foi a noite de 9 de Abrilde 1918. Regressado a Lisboa, em
1919, retirou-se da vida militar pouco tempo depois. Deduzi que fosse Oficial
Miliciano. Homem de estudos e posses seguiu carreira longe dos quartéis no
comércio da Capital durante a década de 20.
Por ter ainda feito uso destas condecorações até tarde, embora muito poucas
vezes, dado o bom estado em que me chegaram (embora também lhes tenha feito
alguma limpeza e pequenos restauros quase desnecessários) optou por pô-las em
conjunto, curiosamente tendo respeitado legislação que viria apenas décadas
mais tarde, não tendo recebido também ou tendo-se perdido no tempo a já referida estrela
de prata.
A batalha de La Lys percegue-me, e bem pela 2ª vez. Sempre fui um apaixonado pela história de Portugal, mas o capitulo de 1914/ 1919 tinha, até aos meus encontros com as Cruzes de 1917, passado completamente ao lado do meu conhecimento e entendimento do esforço Português no mundo.
Há qualquer coisa que me toma o coração de assalto quando toco numa das duas barras de La Lys que tenho. Entre as Cruzes de 1917 que tenho, duvido que me apareça outra igada a esta noite dramática e gloriosa da nossa História, no entanto resta-me o consolo de saber que na esmagadora maioria das peças que aqui trago à um esforço calado pelo tempo, mas não desprezado ou esquecido, que contrbuiu para a continuação de Portugal.
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Para quem gosta destas coisas, os conjuntos de condecorações podem ser um
verdadeiro encanto ou um verdadeiro pesadelo. Muitas vezes, não sabendo a sua
proveniência ou sabendo que nos parecem demasiado bons para serem verdade a
reacção natural é rejeitá-los como legítimos.
Nas outras, onde temos um acervo documentado ou palavras de compromisso de quem
nos passa as coisas, tornam-se mais fáceis quanto à aceitação da sua
legitimidade.
Em Portugal, o cuidado com a (H)história, com o grande e com o pequeno
Património é tanto como o cuidado de um Elefante numa loja de cristais… No caso
das condecorações a história não é diferente. As que nos chegam são quase
sempre individuais, desfeitas das suas irmãs de glória, porque, quem as vende
pensa lucrar mais com Elas separadas do que com Elas num conjunto.
Pois que se enganam. Perdem os que o fazem, perde a História e perde o Futuro.